30/07/2009

A propósito dum delicioso texto de Fernanda Ferreira ...

É um facto inegável, quanto a mim, quando se vive fora do nosso País, que todo o prato tipicamente Português, que possamos confeccionar, fora de Portugal, tem um sabor diferente daquele a que nos habituámos. Problema climático, problema de água, frescura dos produtos utilizados? Acredito nas duas primeiras hipóteses.

Quando recebo amigos estrangeiros, em minha casa, quase sempre apreciam o que cozinho. À excepção de um único que não achou graça nenhuma ao facto de, na 'Carne de Porco à Alentejana', misturarmos ameijoas com carne de porco, todos os outros apreciam a nossa cozinha. Mas este foi o único em algunas dezenas que passaram por minha casa durante estes bons anos em que vivo fora do meu País. Talvez em Itália, onde vivi também, tivesse conseguido melhores resultados no que se refere ao paladar, do que aqueles que obtive no Reino Unido mas, mesmo assim, sempre achei o paladar diferente.

A melhor surpresa que tive, nestes períodos de ausência de Portugal, foi aquela que me reservou uma cliente e amiga de longa data. Ela festejava, com o seu irmão gémeo, os seus 50 anos. Cheguei a Portugal eram 19h e quando estava a meter a chave na porta, no Porto, ouço o telefone tocar. Era esta amiga, convidando-me a ir à Costa (Aveiro), porque gostava que eu fizesse parte do seu grupo de amigos presentes nessa festa. Eu estava muito cansada. A viagem tinha sido bastante 'tremida' e, mais ainda, estava sem carro. Ela tratou de convencer o meu filho Miguel a levar-me e, portanto, seguindo as instruções dela:

- 'Saiem de Aveiro, vão sempre em frente e quando virem muita gente numa varanda e muitos carros estacionados, param porque é aí'

Isto foi uma explicação bastante coerente, se pensarmos que esta minha amiga é fora do comum, pensa fora do comum, vive duma forma pouco comum ... e é deliciosamente imprevisível em tudo.

Quando olhei para as pessoas que estavam na varanda do edifício, ainda da rua, perguntei:

- É aqui ....
Ainda não tinha acabado a frase e houve alguém que respondeu.
- É sim. A senhora é a amiga da Maria Armanda, que vive fora do País?

Bem, amigos, quando cheguei à sala onde já todos estavam a petiscar, havia já bastante tempo, encontro (imaginem), frente aos meus olhos:

Lagosta - Gambas - Ameijoas à Bulhão Pato - Bolinhos de Bacalhau - Azeitonas daquelas que só de olhar, ficamos "augadinhos" (o termo não é meu) - Chouriço grelhado em álcool - Frango no Churrasco, etc., etc........ tudo rematado com um delicioso Caldo Verde com chouriça de colorau.

Meus amigos, escusado será dizer que esqueci todo o tipo de respeito pela saúde e pelas minhas 'tendências' vegetarianas. Que se mordam todos os debates travados numa consciência absoluta de que "Nós somos aquilo que comemos". Coincidências destas não acontecem todos os dias e esta, amigos, até foi cura para o cansaço ... Qual cansaço!!!

Maria Letra

4 comentários:

Fernanda Ferreira - Ná disse...

Amiga Mizita...ninguém resistiria!!!

São assim os Portugueses.
A sua amiga de "excêntrica" não tem nada, eu também não sei dar indicações, as mais elementares, falta-me imenso o sentido de orientação...ninguém é perfeito!!!

Cozinhar é uma arte, um dom, e saber receber bem, como os Portugueses só mesmo nós.

Podia contar-lhe histórias incríveis...talvez um dia, em pequenas crónicas gostosas como a sua.

Beijinhos

Maria Letr@ disse...

Obrigada pelo comentário, Ná.
Tem razão, a minha amiga é um misto de virtudes: excêntrica (agradável), engraçada, cheia de vida e muito, muito divertida. Somos amigas desde 1986. Já lá vão uns anos. É assim que conservo os amigos, durante anos, até que a morte nos separe.
Acabei de saber que a semana passada lhe assaltaram a loja, deixando-a completamente vazia. Nem consigo enfrentar essa triste realidade de que as coisas estejam assim tão graves para quem tem um negócio aberto ao público, em Portugal (e não só!).
Beijinhos.
Maria Letra

Vitor Chuva disse...

Olá Mizita!
O episódio por si relatado traz-me à memória um outro, com algumas semelhanças, passado aí em Londres.
É verdade que aquilo que em Portugal resulta em termos culinários nem sempre é repetível noutro contexto.
Convidando uns amigos Ingleses para lhes dar uma ideia do que é a cozinha Portuguesa, levei-os a um restauarante Português em Beauchamp Place, não muito longe da estação do "metro" em Kensington.Do nome do mesmo já me não recordo (Algarve; Fado; Luso, ???);sei que havia dois ou três na mesma rua.Escolhi "Carne de porco à Alentejana", um dos meus favoritos...e o resultado foi um desatre; eu nunca tinha experimentado algo tão mau, e fiquei embaraçado, com não podia deixar de acontcer!
Conclusão: em matéria de culinária as traduções à letra nem sempre resultam, é o que me parece!
Um abraço.
Vitor Chuva.

Maria Letr@ disse...

Olá amigo Victor Chuva!
Obrigada pelo seu comentário.
Sim, conheço bem o Restaurante "O Fado". Nunca mais lá fui, depois da morte do seu proprietário. Eles costumavam ter fado, creio que à sexta-feira. Fica, realmente, em Beauchamp Place, perto de Brompton Road, onde era, antigamente, o Consulado de Portugal.
Comi lá esse prato, para matar saudades, mas também não gostei mesmo nada. Nem eu nem quem estava comigo.
Estava a ver se conseguia recordar-me dum restaurante português que 'me disseram' ter ganho aqui um prémio como o local onde se come os melhores pratos de peixe, mas não consigo lembrar-me. Dir-lhe-ei quando souber. Fui lá já umas 3 vezes (fizemos lá a festa de baptizado dum dos meus netos, que nasceu aqui) e posso dizer-lhe que me agrada imenso lá ir. Come-se muito bem. Todavia, comer pratos portugueses, como os que são feitos aí, na minha opinião, não encontramos em nenhum lado.

Um abraço.
Maria Letra