Inicialmente seríamos mais, só que na última semana confirmaram e finalmente apareceram mesmo só quatro aventureiros: o Abílio, o Tony, o Filipe e o Ferreira (moi -même). Estávamos em Abril de 2004.
Planeado ao pormenor com antecedência, estes quatro magníficos decidiram partir de Campos/ VNC e ir comer uma cabritada aos Cerejais/ Alfandega Fé.
Meio de transporte, bicicletas de btt, cerca 300 Kms a passar por estradas municipais, três dias de viagem. Regresso de carro.
1ª etapa – Campos a Braga, cerca de 70 Kms, dormida na Pousada de juventude.
Campos
Jornada normal sem grandes complicações de percurso. Almoço em Ponte do Lima,restaurante típico com dieta rigorosa a condizer pois os kms só agora começavam.
Jantar e dormida em Braga, ementa sardinhas fritas com arroz de tomate, a dieta continuava rigorosa.
Antes de dormir ainda foram uns fininhos para o relaxe.
Estávamos já na camarata quando chegou "aquilo", cujo aspecto retratava um Obélix de nacionalidade desconhecida. Enquanto fazíamos a higiene normal, começamos a ouvir um barulho grotesco que provinha da dita personagem. Fomos espreitar, o volume do ser era tal que só de lado e encolhido cabia no beliche, os ruídos que emanava eram do outro mundo, desde lamentos em língua desconhecida, roncos assobiados a sons que ecoavam daquelas entranhas. Resultado, os meus companheiros passaram a noite a jogar cartas, insultar e gozar com o “bicho”. Eu desliguei o aparelho e consegui dormitar.
2ª etapa – Braga a Murça, cerca de 155 km, era a etapa mais longa e árdua.
Aqui iria testar se a minha preparação prévia e intensa de 40 dias fora adequada.
Municipio de Murça
Logo de manhã saímos da Pousada pelas 7horas, encontramos uma frutaria quase a abrir e fizemos aí um pequeno-almoço salutar.
O nevoeiro cerrado ajudou-nos na íngreme subida do Sameiro. Almoço em Mondim de Basto, a dieta continuava, a ementa apontava para uma feijoada. Alertei os guerreiros para a jornada que se seguiria, pois além de viajarmos sentados o que dificultaria a digestão (claro), a tarde soalheira dificultaria o passeio.
O aviso funcionou, assim o repasto passou para o lombo assado, bem mais leve.
Quando vieram duas travessas, começaram de imediato a dividir, só que de seguida presentearam-nos com mais duas. Resultado, mandaram os pratos embora e comeram das travessas. Isto paga-se, por isso no fim da refeição, chegou-lhes uma fraqueza tal que desmaiaram num relvado lateral ao restaurante, dormiram profundamente quase duas horas. Estava compensada a noitada. Ao longe contemplava-se a Srª. da Graça. Eu fui bebendo (água, pois claro) a tarde prometia.
Faltavam ainda uns bons km para Murça, quando a água acabou. Tínhamos atravessado longas paisagens sem avistar “viv’alma”. Por fim, bem lá no fim do mundo, uma casa junto à estrada um casal de amabilíssimos professores disponibilizou-nos aquilo que já parecia uma miragem, água muita água, além do conforto moral, disseram-no que o pior estava pela frente. Nada que o pessoal já não tivesse comido.
Murça, jantar divinal com dieta mais que rigorosa, muito coelho bravo à caçador. Sem mais comentários, íamos dormir mesmo ali.
Estava cumprida a mais longa e dura das etapas, correu tudo muito bem.
3ª etapa- Murça aos Cerejais, cerca de 75 km para o cabrito.
Juntas
Pelas 7 horas, pequeno-almoço reforçado na pensão. Iríamos descer as célebres curvas de Murça. Foi um “ver se te avias”, estava frio e a descida foi louca, ao ponto de logo à chegada ao centro da vila, cerca de 30 minutos da partida, já estávamos a meter bifanas e sumos cá para dentro. A adrenalina fez das suas.
A manhã e o almoço em Cabeceiras de Basto decorreram sem qualquer ponto a referir. No entanto, a tarde solarenga fez das suas. O sol escaldante, o ar seco, aquela brisa que por vezes soprava, fazia chegar até nós o doce, exótico quase afrodisíaco perfume floral da “esteva" que predominava no ar por uma distância considerável.
Com muitos kms acumulados, o cabrito no forno de lenha, as fortes subidas, a sede e o sol quente obrigou-nos a parar em Vieiro/Vila Flor,(terra da Graça Morais).
Um parente do organizador já nos esperava. Entretanto o Abílio, o mentor da ideia e responsável pelo cabrito nos Cerejais, prometia pela 50ª vez que iria fazer o resto da viagem de camioneta,(saudades de casa… acontece a quem não se prepara convenientemente). Prometia também que nos próximos dez anos, não repetiria este passeio.
Por ter tido entretento um furo, fui o último a chegar à adega, já todos estavam a trincar umas deliciosas boroas de milho e mel.
Como estava com mais sede do que apetite, bebi de uma só vez aquilo que me serviram num daqueles copos de vidro muito grosso, estava cheio e depreendi ser vinho. Só quando chegou ao fundo é que me apercebi que se fosse veneno estaria morto, mas a verdade é que era vinho do Porto caseiro, o chamado generoso e muito bom. Resultado mais uma boroa mais um copo e a alma até saltou.
Estava pronto para todos os kms que viessem.
Seguimos... por fim já com os Cerejais à vista (terra com 200 habitantes) o Abílio dá-nos uma noticia que quase nos matava a todos, ali naquela terra onde a estrada não tem qualquer outra saída (entramos e saimos pela mesma), onde não se produz quase nada, pois o Inverno é rigoroso e o Verão um Inferno, ali bem quase no fim do nada, depois de Ponte do Lima, Braga, Vieira do Minho, Vila Pouca Aguiar, Murça, Mondim Basto, Cabeceiras de Basto, Vila Flor, Alfandega Fé, depois de tanto sol, de uma noite demoníaca quase não dormida, de tanto comer, de mais beber, ali, precisamente ali, cai a bomba - “não existiam mulheres”, diz-nos ele, as suas irmãs eram as únicas e uma era freira. (Definitivamente, o sol tinha-lhe esturricado o miolo). Olhamos uns para os outros de olhos aguados, foi unânime - suicídio colectivo, ou assassinato com justa causa. Tínhamos que nos vingar… O delicioso cabrito regado com mais um daqueles néctares particulares, proveniente das entranhas daquele solo pedregoso, onde nada nasce, mas o pouco que produz é divino, pagou a fava. Naquele momento esquecemos tudo. Pecamos….
O jantar terminou, a vingança estava consumada. Não sobrou nada, nem para os cães que também não existiam. A viagem de regresso de carro, tinha que ser feita nas calmas, as “binas” eram rebocadas. O pessoal dormiu como os heróis dormem, depois de uma dura batalha vencida. Ganhamos, ganhamos.
Já voltei a fazer este percurso com a Fernanda, desta vez de carro num só dia, fui comprar daquele néctar que numa jornada nos elevou toda a moral e nos deu forças para continuar, aquela que para mim foi única, uma viagem inesquecível.
Planeado ao pormenor com antecedência, estes quatro magníficos decidiram partir de Campos/ VNC e ir comer uma cabritada aos Cerejais/ Alfandega Fé.
Meio de transporte, bicicletas de btt, cerca 300 Kms a passar por estradas municipais, três dias de viagem. Regresso de carro.
1ª etapa – Campos a Braga, cerca de 70 Kms, dormida na Pousada de juventude.
Campos
Jornada normal sem grandes complicações de percurso. Almoço em Ponte do Lima,restaurante típico com dieta rigorosa a condizer pois os kms só agora começavam.
Jantar e dormida em Braga, ementa sardinhas fritas com arroz de tomate, a dieta continuava rigorosa.
Antes de dormir ainda foram uns fininhos para o relaxe.
Estávamos já na camarata quando chegou "aquilo", cujo aspecto retratava um Obélix de nacionalidade desconhecida. Enquanto fazíamos a higiene normal, começamos a ouvir um barulho grotesco que provinha da dita personagem. Fomos espreitar, o volume do ser era tal que só de lado e encolhido cabia no beliche, os ruídos que emanava eram do outro mundo, desde lamentos em língua desconhecida, roncos assobiados a sons que ecoavam daquelas entranhas. Resultado, os meus companheiros passaram a noite a jogar cartas, insultar e gozar com o “bicho”. Eu desliguei o aparelho e consegui dormitar.
2ª etapa – Braga a Murça, cerca de 155 km, era a etapa mais longa e árdua.
Aqui iria testar se a minha preparação prévia e intensa de 40 dias fora adequada.
Municipio de Murça
Logo de manhã saímos da Pousada pelas 7horas, encontramos uma frutaria quase a abrir e fizemos aí um pequeno-almoço salutar.
O nevoeiro cerrado ajudou-nos na íngreme subida do Sameiro. Almoço em Mondim de Basto, a dieta continuava, a ementa apontava para uma feijoada. Alertei os guerreiros para a jornada que se seguiria, pois além de viajarmos sentados o que dificultaria a digestão (claro), a tarde soalheira dificultaria o passeio.
O aviso funcionou, assim o repasto passou para o lombo assado, bem mais leve.
Quando vieram duas travessas, começaram de imediato a dividir, só que de seguida presentearam-nos com mais duas. Resultado, mandaram os pratos embora e comeram das travessas. Isto paga-se, por isso no fim da refeição, chegou-lhes uma fraqueza tal que desmaiaram num relvado lateral ao restaurante, dormiram profundamente quase duas horas. Estava compensada a noitada. Ao longe contemplava-se a Srª. da Graça. Eu fui bebendo (água, pois claro) a tarde prometia.
Faltavam ainda uns bons km para Murça, quando a água acabou. Tínhamos atravessado longas paisagens sem avistar “viv’alma”. Por fim, bem lá no fim do mundo, uma casa junto à estrada um casal de amabilíssimos professores disponibilizou-nos aquilo que já parecia uma miragem, água muita água, além do conforto moral, disseram-no que o pior estava pela frente. Nada que o pessoal já não tivesse comido.
Murça, jantar divinal com dieta mais que rigorosa, muito coelho bravo à caçador. Sem mais comentários, íamos dormir mesmo ali.
Estava cumprida a mais longa e dura das etapas, correu tudo muito bem.
3ª etapa- Murça aos Cerejais, cerca de 75 km para o cabrito.
Juntas
Pelas 7 horas, pequeno-almoço reforçado na pensão. Iríamos descer as célebres curvas de Murça. Foi um “ver se te avias”, estava frio e a descida foi louca, ao ponto de logo à chegada ao centro da vila, cerca de 30 minutos da partida, já estávamos a meter bifanas e sumos cá para dentro. A adrenalina fez das suas.
A manhã e o almoço em Cabeceiras de Basto decorreram sem qualquer ponto a referir. No entanto, a tarde solarenga fez das suas. O sol escaldante, o ar seco, aquela brisa que por vezes soprava, fazia chegar até nós o doce, exótico quase afrodisíaco perfume floral da “esteva" que predominava no ar por uma distância considerável.
Com muitos kms acumulados, o cabrito no forno de lenha, as fortes subidas, a sede e o sol quente obrigou-nos a parar em Vieiro/Vila Flor,(terra da Graça Morais).
Um parente do organizador já nos esperava. Entretanto o Abílio, o mentor da ideia e responsável pelo cabrito nos Cerejais, prometia pela 50ª vez que iria fazer o resto da viagem de camioneta,(saudades de casa… acontece a quem não se prepara convenientemente). Prometia também que nos próximos dez anos, não repetiria este passeio.
Por ter tido entretento um furo, fui o último a chegar à adega, já todos estavam a trincar umas deliciosas boroas de milho e mel.
Como estava com mais sede do que apetite, bebi de uma só vez aquilo que me serviram num daqueles copos de vidro muito grosso, estava cheio e depreendi ser vinho. Só quando chegou ao fundo é que me apercebi que se fosse veneno estaria morto, mas a verdade é que era vinho do Porto caseiro, o chamado generoso e muito bom. Resultado mais uma boroa mais um copo e a alma até saltou.
Estava pronto para todos os kms que viessem.
Seguimos... por fim já com os Cerejais à vista (terra com 200 habitantes) o Abílio dá-nos uma noticia que quase nos matava a todos, ali naquela terra onde a estrada não tem qualquer outra saída (entramos e saimos pela mesma), onde não se produz quase nada, pois o Inverno é rigoroso e o Verão um Inferno, ali bem quase no fim do nada, depois de Ponte do Lima, Braga, Vieira do Minho, Vila Pouca Aguiar, Murça, Mondim Basto, Cabeceiras de Basto, Vila Flor, Alfandega Fé, depois de tanto sol, de uma noite demoníaca quase não dormida, de tanto comer, de mais beber, ali, precisamente ali, cai a bomba - “não existiam mulheres”, diz-nos ele, as suas irmãs eram as únicas e uma era freira. (Definitivamente, o sol tinha-lhe esturricado o miolo). Olhamos uns para os outros de olhos aguados, foi unânime - suicídio colectivo, ou assassinato com justa causa. Tínhamos que nos vingar… O delicioso cabrito regado com mais um daqueles néctares particulares, proveniente das entranhas daquele solo pedregoso, onde nada nasce, mas o pouco que produz é divino, pagou a fava. Naquele momento esquecemos tudo. Pecamos….
O jantar terminou, a vingança estava consumada. Não sobrou nada, nem para os cães que também não existiam. A viagem de regresso de carro, tinha que ser feita nas calmas, as “binas” eram rebocadas. O pessoal dormiu como os heróis dormem, depois de uma dura batalha vencida. Ganhamos, ganhamos.
Já voltei a fazer este percurso com a Fernanda, desta vez de carro num só dia, fui comprar daquele néctar que numa jornada nos elevou toda a moral e nos deu forças para continuar, aquela que para mim foi única, uma viagem inesquecível.
J.Ferreira
Fernanda Ferreira
8 comentários:
Amigo João,
Não, não é engano... é mesmo do José.
Acredite que desta vez nem lhe falei em dar-me os tópicos para a história.
Essa da matriarca está-me atravessada, ahahahahah!
Abraços
Ná & José
O meu comentário vai para os dois. Para o José a felicitá-lo pelo belo passeio e palas sensações de cada momento e de cada pedaço e de copo, pelo belo texto da narrativa. Para a matriarca, a minha crítica por não permitir ao SJ passar a ter um novo e belo autor. Mesmo que só queira escrever um post por mês ou por quinzena ou por semana, será um enriquecimento para este espaço.
Por favor Ná, dê autorização. Envie-lhe o convite. Deixe de colocar o seu nome por baixo como se ele fosse ainda de menor idade!!!
Um grande abraço para os dois.
João
Caro amigo João,
O José leu o seu comentário, que muito o honra.
Para não me acusar de "matriarca" que não sou de todo, consegui convencê-lo a ser mais um dos nossos colaboradores. Contudo, tenha presente que ele só escreverá mesmo muito esporadicamente.
Beijos
Ná
Parabéns então ao José por se juntar a nós.
Quanto ao passeio, uma aventura verdadeiramente inesquecível!
Beijinhos,
Ana Martins
Querida Ná,
Eu não quero nada do José!!! Apenas pretendo que ele sempre que quiser publicar algo de sua criação não tenha de depender do favor da Ná. Sendo autor pode publicar, não importa quando nem quanto!!! O que sei é que será boa literatura e belas fotos.
Espero que inaugure a sua colaboração no mosso blogue, para lhe dar as boas vindas.
Queridos amigos Ana a João,
Lá terei que ser eu a responder aos simpáticos elogios ...
Vamos ver quantas vezes o José o fará!!!
Obrigada amiga Ana pelas boas vindas ao José.
Amigo João, o José acabará por lhe dizer algo sobre este assunto.
Uma coisa é certa, como todos nós no início, ele também precisará de uma ajuda, mesmo publicando por sua conta. A sua experiência nesta área é quase nula.
Muito obrigada, em seu nome, pelos elogios.
Beijos
Ná
Caros amigos,
Gotaria de agradecer a simpatia como fui recebido, muito especialmente pelo amigo João Soares.
Muito grato.
Voltarei assim que me for possível.
Cumprimentos a todos,
J.Ferreira
Queridos Amigos,
Lindo passeio ciclo-turista! Cá pelo Alentejo, com tudo mais plano, veem-se muitos estrangeiros a faze-lo e já alguns portugueses!
Agora aí no Norte é preciso ter coragem para afrontar as serras e vales aí existentes! Os meus parabéns aos dois!
Um forte abraço.
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