03/09/2009

"O Mundo Virado do Avesso"

Em conjunto com o seu núcleo familiar mais próximo (marido e filha), vivia um quotidiano preenchido e feliz. Como família, poderíamos classificá-la como estando confortavelmente instalados na vida; tanto ela como o marido tinham bons empregos; a filha estava a estudar na Universidade, e o futuro parecia risonho e promissor.

Conviver com os muitos amigos que foram fazendo ao longo dos anos, para além dos familiares, era algo de que muito gostavam, e com frequência punham em prática: a casa parecia estar sempre cheia, uma espécie “de ponto de encontro”, sendo ela, por gosto e vocação, a “animadora de serviço”, exemplo de permanente e contagiante boa disposição. Com o passar dos anos, pelo espírito de iniciativa nela sempre presente, aliado ao comodismo manifestado pelo resto dos amigos, eles acabaram por ter um papel de liderança: eram como que o núcleo em redor do qual o resto de nós, de bom grado, se foi instalando e acomodando.

Professora, no tempo que tinha livre sempre se mostrava disposta a ajudar crianças que porventura manifestassem maiores dificuldades na escola, fazendo-o de graça na maioria dos casos; o género de pessoa de quem normalmente se diz “ter bicho carpinteiro”, sempre com algo de útil ou interessante para fazer. Gostava de escrever poesia , tocar guitarra, sendo que um dos seus passatempos favoritos consistia na recolha de anedotas, versos e ditados populares, além de outras formas típicas de expressão, tendo sempre à mão um caderninho onde ia tomando os seus apontamentos.


Aparentemente, a vida não poderia correr-lhe melhor, tal como para o resto da família, até àquele dia fatídico em que o infortúnio resolveu bater-lhe à porta. O telefone tocou e ela atendeu; do outro lado informaram-na que o marido tinha sido levado do local de trabalho para o hospital, e que, aparentemente, as perspectivas eram mais do que sombrias quanto ao desfecho previsível. Após alguns meses de internamento os seus piores receios confirmaram-se; ouviu as palavras que tanto temia: ele estava paraplégico, confinado a uma cadeira de rodas para o resto dos seus dias. Naquele breve instante, que nele continha todo o seu futuro, o seu pequeno mundo, tão moldado à sua imagem, tinha-se desmoronado: ela sabia que a partir dali a sua vida nunca mais seria a mesma .
Vitor Chuva

03-09-2009

Vitor Chuva

7 comentários:

Adelaide disse...

Amigo Vitor Chuva,

Mais uma história de vida que
começa tão bem, onde existe felicidade, uma vida calma e cheia de paz.
Um simples telefonema veio destruir toda a paz de toda uma vida feliz.
Esta história de vida, infellizmente, acontece em muitas famílias. Acontecimentos que entristecem quem deles toma conhecimento através dos meios de comunicação, ou de outros mais próximos que fazem com que o desgosto seja ainda mais doloroso.

Mais um breve e verdadeiro conto do nosso amigo Vitor.

Abraço
Mara

UBIRAJARA COSTA JR disse...

Vitor

Triste mas verdadeiro.
Quando menos se espera a vida dá uma guinada e joga-nos no chão.

Um abraço
Dulce

Fernanda Ferreira - Ná disse...

Amigo Vitor,

Triste realidade essa, que de repente, alterou a vida de duas pessoas definitivamente.

Beijo

A. João Soares disse...

Amigo Vitor,

Com tal situação, a vida realmente não será a mesma. Mas com as qualidades que sempre demonstrou ter, saberá tirar da vida algo que continue a evidenciar a sua superioridade.
Conheço um homem que ainda jovem ficou totalmente cego sem um braço a que prendeu uma próteses pouco mais que ornamental, o outro antebraço amputado pelo meio é usado com os dois ossos como «dedos» para comer por si, usar o telemóvel e o próprio computador que é comandado à voz, com software especial. Tem duas licenciaturas e não pára. (Sobre ele há dois ou três posts num dos meus blogs e fotografias no Só imagens, em 12 de maio).
Isto para concretizar as palavras de que as pessoas com valor não se deixam destruir com os azares da vida, que por vezes lhes dão oportunidade para exibirem novas habilidades que andavam ocultas.

Abraço
João

Vitor Chuva disse...

Olá Mara; Dulce; Fernanda; João!

Obrigado a todos pelos vossos comentários.

Como costuma dizer-se, a vida troca-nos, por vezes, as voltas. Este é um caso verídico que me tocou, e toca, de perto.A amiga, ainda que perdendo o seu modo de vida, não perdeu, felizmente, o seu espírito alegre e combativo; ainda consegue brincar, recusando ser vencida.

Um abraço.

Vitor Chuva

Luis disse...

Caro Amigo,
A Vida por vezes é muito amarga, como no caso apresentado. Felizmente parece que no núcleo familiar, apesar de tudo, existe aquela força de vontade para tudo vencer. Conheço casos desta natureza, tal como o apresentado pelo João que conseguem dar a "volta por cima" e continuarem felizes com a sua sorte! Desejo que seja este o caso!
Um forte abraço.

Vitor Chuva disse...

Caro Luis!

Bom regresso a este espaço de convívio, e obrigado pelo comentário. É verdade, apesar do seu infortúnio, eles, como família, continuam a fazer uma vida tão normal quanto possível, com a juda dos muitos amigos e familiares.~

Um abraço.

Vitor Chuva