O Alberto e eu fomos colegas de trabalho numa Siderurgia, durante vários anos, desempenhando ambos, durante algum tempo, a função de chefia de turno. Quando acontecia ser eu a rendê-lo, uns minutos antes das 08:00 , de imediato ele abandonava o local de trabalho; àquela hora, qual mecanismo programado, lá estava ele a “picar o cartão”; nem um minuto mais tarde, a menos que isso fosse completamente inevitável. Contudo, a esta rígida regra de conduta, que ele fazia questão de religiosamente cumprir, Alberto abria, ocasionalmente, uma excepção e essa acontecia quando os resultados do turno superavam claramente os objectivos estabelecidos, indo para além daquilo que era expectável e dele exigido; eram, por razões óbvias, boas notícias para todas as pessoas envolvidas!
Sempre que isto acontecia, o colega Alberto arranjava sempre um pretexto para ficar lá pelo gabinete durante mais alguns minutos, os suficientes para que o nosso superior hierárquico chegasse e tomasse conhecimento dos bons resultados por ele obtidos. Assistindo, então, à cena, não podia deixar de sentir-me tentado a estabelecer comparação entre o que via e o comportamento de outros animais, menos racionais, em circunstâncias equivalentes. Não que eu o tenha presenciado, mas arriscaria em afirmar que ele terá recebido o seu “torrãozinho-de–açúcar” , já que , pessoa por natureza calada, metida consigo mesmo, fechado, de repente todo ele era sorrisos, falador, sociável, exibindo um ar de enorme satisfação, “só não abanando o rabo porque não tinha”, pensava eu: verdadeira metamorfose a sofrida pelo Alberto, agora completamente alheado da marcha do relógio; nenhuma pressa em partir, saboreando a “glória” do sucesso recentemente alcançado.
Ocorreu-me então que, inconscientemente, ou se calhar nem por isso, também eu tinha feito exactamente o mesmo em circunstâncias semelhantes; outros colegas igualmente o teriam feito. Recebermos o nosso “torrão–de-açúcar” no final duma corrida em que demos boa conta de nós é algo que achamos que nos é devido, nosso por direito próprio, e certamente que todos nos sentiremos bem ao receber o dito quando acreditamos ter feito por merecê-lo, ainda que, por vezes, possamos sentir alguma relutância ou menos à vontade em admiti-lo, perante outros.
A nossa auto-estima sofrerá certamente um empurrãozinho para cima; correremos, porventura, o risco de que o ego possa ficar um pouquinho inchado, mas daí também não virá , certamente, grande mal ao mundo: nada que não possamos resolver.
No fundo, no fundo, julgo que todos os “Albertos” desejarão que momentos como estes lhes possam acontecer, já que nada de mal daqui poderá resultar; afinal, “um torrão–de-açúcar”, se pensarmos bem, é apenas um pequeno doce … e, às vezes, sabe tão bem!
Vitor Chuva
26-08-2009
26-08-2009
3 comentários:
Maravilhoso, amigo Vitor !!!
Quem não gosta do seu torrãozinho de açúcar se faz por merecê-lo??? se não espezinha ninguém para o conseguir (um facto muito em voga ultimamente), esse docinho é um estímulo que todas as entidades patronais deviam dar para ver os seus lucros aumentados.
É que um trabalhador incentivado vale por dois, como bem sabemos todos.
Obrigada por mais esta excelente narrativa.
Parabéns.
Beijo
Fernanda
Caro Vitor,
Um bom texto de antologia, como já nos habituou.
O torrão de açúcar, ou a cenoura, constitui uma ferramenta da gestão de recursos humanos. Merecê-los ou procurar merecer é um incentivo e uma prova de bom desempenho.
O mal reside muitas vezes nos maus chefes que olham mais para o lamber das botas do que para a boa qualidade do desempenho. E há os que com inveja dos colegas mais eficientes levantam intrigas junto do chefe para disso receberem o açúcar, lesando a avaliação do outro que, sendo melhor, acaba por não ter a recompensa que realmente merece. Conheço exemplos de tudo nesta vida de experiências variadas e intensas.
Um abraço
João
Olá João e Fernanda!
Se atentarmos bem, o essencial do progresso feito pela Humanidade foi conseguido , essencialmente, através de estímulos vários, o alcançar a recompensa como prémio do esforço feito. É uma verdade intemporal, e desconhecê-la ou não a praticar é uma atitude ignorante, que se paga caro, embora possa não o parecer.
Obrigado pelos simpáticos comentários.
Vitor Chuva
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