Não sendo a água o nosso meio natural, nem estando equipados para nela viver, ainda assim sentimos-nos atraídos por ela. Talvez porque toda a vida animal sobre a superfície da terra dela tenha originado, (segundo a opinião de muita gente qualificada) daí resulte este forte apelo que ela exerce sobre nós.
No meu caso pessoal, e de acordo com a minha mãe, "tal atracção" manifestou-se logo desde muito cedo. Por diversas vezes lhe ouvi contar a história do que um dia me aconteceu quando ela me levou até uma pequena terra que possuíamos, com a finalidade de apanhar hortaliça. Pequenote na altura, ela pousou-me no chão, dentro de uma cesta, ocupando-se, de seguida, a fazer o seu trabalho.
Eu não sei explicar o que aconteceu … mas , diz ela , que, quando a dado momento olhou para a cesta para certificar-se de que tudo estava bem comigo, não me conseguiu ver – eu não estava lá; aflita, descobriu-me caído dentro duma vala, metido em água até ao pescoço. Claro que tudo acabou bem - ou eu não estaria aqui, a contar o episódio - (agora divertido), mas fácil será imaginar o grande susto que ela terá, então, apanhado!
A casa de meus pais, que ainda lá está, fica no cimo de uma encosta, com uma vista linda, à altura ainda ampla e desimpedida, sobre o rio Mondego, que corre lá em baixo, a cerca de meio quilómetro de distância. A povoação era pequena, poucos os habitantes, mas, ainda assim, conseguíamos reunir um grupinho de seis, muito chegado, e com idades muito próximas. Por volta dos oito, nove anos, já íamos todos para a beira-rio, a chapinhar na água e a aprender a nadar; os mais velhos davam um mãozinha aos mais novos e, começando pelo chamado estilo “nadar à cão “, passado algum tempo já nos sentíamos com peixe na água.
Férias grandes, eram três meses e meio de rio. Reunido o grupo, lá íamos todos, de manhã ou de tarde; não importava se praia-mar ou baixa-mar.
No caminho, passando pelas terras que marginavam o rio, íamos apanhando a fruta que encontrávamos, para um lanchesinho, antes da volta a casa. Quando algum de nós estava “mais endinheirado”, então lá nos dirigíamos à mercearia, que calhava em caminho, comprar uns cinco ou dez tostões de amendoins; embrulhados em papel pardo enrolado em forma de cone, eram religiosamente guardados para o final da brincadeira. Sentados em cima das pedras, ao sol, abrigados pelas tamargueiras, eram os mesmos, então, irmãmente repartidos, e com parcimónia comidos para fazer prolongar esse momento de prazer.
O rio, enquanto as férias duravam, era o nosso poiso de eleição; entrada não era preciso pagar; calções de banho também não eram exigidos. E nos períodos de maré baixa, com os cabeços de areia deixados a descoberto e a água mais quentinha … era uma festa; a celebração da amizade simples e ingénua, da alegria entre amigos, sem preocupações de espécie alguma, a não ser a de chegar a casa antes que o pai voltasse do trabalho – essa era uma regra básica a respeitar, para evitar dissabores! De quando em vez, lá conseguíamos convencer o barqueiro – era preciso apanhá-lo bem disposto e com pouca gente para transportar - a deixar-nos entrar na barca e com ele atravessar o rio. O prazer era enorme; no meio do rio, olhando para a paisagem em volta, ao mesmo tempo que admirávamos a aparente facilidade com que ele conduzia a embarcação e executava todas aquelas manobras inerentes a um barco `a vela … eram momentos inesquecíveis!
Naquela época, tendo-se relativamente pouco - pelo menos dinheiro – era, ainda assim, possível ser-se imensamente feliz. Ou, então, olhando de outro ângulo, até poderíamos considerar-mo-nos ricos, já que, afinal, e bem vistas as coisas, tínhamos um rio quase só para nós, e todo o tempo do mundo e liberdade para brincar, sem restrições ou preocupações. Naquela idade tudo se nos afigurava simples e sem complicações, e, à altura, não tínhamos razão alguma para pensar que as coisas alguma vez tivessem que mudar. Olhando em retrospectiva, e tal como diz uma popular canção dos anos 60, “Those were the days my friend (s)”…
Vitor Chuva
17-06-2009
Notas Pessoais:
A minha “atracção” pela água não se quedou por aqui, perdurando até ao dia de hoje. No caminho percorrido contam-se dez anos vividos muito próximos dela, tantos quantos os passados na Armada. Sobre este período escrevi algumas curtas histórias, relatando viagens efectuadas, publicadas no meu blog, o qual vos convido a visitar.
vitorchuva-shortstories
Fernanda Ferreira
No meu caso pessoal, e de acordo com a minha mãe, "tal atracção" manifestou-se logo desde muito cedo. Por diversas vezes lhe ouvi contar a história do que um dia me aconteceu quando ela me levou até uma pequena terra que possuíamos, com a finalidade de apanhar hortaliça. Pequenote na altura, ela pousou-me no chão, dentro de uma cesta, ocupando-se, de seguida, a fazer o seu trabalho.
Eu não sei explicar o que aconteceu … mas , diz ela , que, quando a dado momento olhou para a cesta para certificar-se de que tudo estava bem comigo, não me conseguiu ver – eu não estava lá; aflita, descobriu-me caído dentro duma vala, metido em água até ao pescoço. Claro que tudo acabou bem - ou eu não estaria aqui, a contar o episódio - (agora divertido), mas fácil será imaginar o grande susto que ela terá, então, apanhado!
A casa de meus pais, que ainda lá está, fica no cimo de uma encosta, com uma vista linda, à altura ainda ampla e desimpedida, sobre o rio Mondego, que corre lá em baixo, a cerca de meio quilómetro de distância. A povoação era pequena, poucos os habitantes, mas, ainda assim, conseguíamos reunir um grupinho de seis, muito chegado, e com idades muito próximas. Por volta dos oito, nove anos, já íamos todos para a beira-rio, a chapinhar na água e a aprender a nadar; os mais velhos davam um mãozinha aos mais novos e, começando pelo chamado estilo “nadar à cão “, passado algum tempo já nos sentíamos com peixe na água.
Férias grandes, eram três meses e meio de rio. Reunido o grupo, lá íamos todos, de manhã ou de tarde; não importava se praia-mar ou baixa-mar.
No caminho, passando pelas terras que marginavam o rio, íamos apanhando a fruta que encontrávamos, para um lanchesinho, antes da volta a casa. Quando algum de nós estava “mais endinheirado”, então lá nos dirigíamos à mercearia, que calhava em caminho, comprar uns cinco ou dez tostões de amendoins; embrulhados em papel pardo enrolado em forma de cone, eram religiosamente guardados para o final da brincadeira. Sentados em cima das pedras, ao sol, abrigados pelas tamargueiras, eram os mesmos, então, irmãmente repartidos, e com parcimónia comidos para fazer prolongar esse momento de prazer.
O rio, enquanto as férias duravam, era o nosso poiso de eleição; entrada não era preciso pagar; calções de banho também não eram exigidos. E nos períodos de maré baixa, com os cabeços de areia deixados a descoberto e a água mais quentinha … era uma festa; a celebração da amizade simples e ingénua, da alegria entre amigos, sem preocupações de espécie alguma, a não ser a de chegar a casa antes que o pai voltasse do trabalho – essa era uma regra básica a respeitar, para evitar dissabores! De quando em vez, lá conseguíamos convencer o barqueiro – era preciso apanhá-lo bem disposto e com pouca gente para transportar - a deixar-nos entrar na barca e com ele atravessar o rio. O prazer era enorme; no meio do rio, olhando para a paisagem em volta, ao mesmo tempo que admirávamos a aparente facilidade com que ele conduzia a embarcação e executava todas aquelas manobras inerentes a um barco `a vela … eram momentos inesquecíveis!
Naquela época, tendo-se relativamente pouco - pelo menos dinheiro – era, ainda assim, possível ser-se imensamente feliz. Ou, então, olhando de outro ângulo, até poderíamos considerar-mo-nos ricos, já que, afinal, e bem vistas as coisas, tínhamos um rio quase só para nós, e todo o tempo do mundo e liberdade para brincar, sem restrições ou preocupações. Naquela idade tudo se nos afigurava simples e sem complicações, e, à altura, não tínhamos razão alguma para pensar que as coisas alguma vez tivessem que mudar. Olhando em retrospectiva, e tal como diz uma popular canção dos anos 60, “Those were the days my friend (s)”…
Vitor Chuva
17-06-2009
Notas Pessoais:
A minha “atracção” pela água não se quedou por aqui, perdurando até ao dia de hoje. No caminho percorrido contam-se dez anos vividos muito próximos dela, tantos quantos os passados na Armada. Sobre este período escrevi algumas curtas histórias, relatando viagens efectuadas, publicadas no meu blog, o qual vos convido a visitar.
vitorchuva-shortstories
Fernanda Ferreira
5 comentários:
Mana, que saudades sentí de minha infancia! Lendo a materia postada por voce,voltei no tempo e me ví diante na lagoa em frente nossa casa,a jogar farinha de mandioca, atrair os peixinhos e mergulhar em suas aguas, a peneira de vime a fim de recolher peixinhos e os engolir inteiros e vivos, com um objetivo: aprender a nadar.rsr
Bons tempos aqueles!!!
Observação:
Ná, algumas vezes não traduzo a palavra que voces empregam, procuro entende-la pelo sentido da frase.
E eu tenho me feito entender?
É muito legal estas pequeninas diferenças, adoro ouvi-los.
Beijinhos!
Querida mana Celle,
Este belíssimo texto foi escrito e conta uma das muitas histórias verídicas do meu amigo Vitor Chuva...mas é verdade sim, ela também me faz lembrar a minha infância, os meus banhos no rio Minho e na presa dos meus avós paternos`... e tantas outras outras coisas.
O Vitor tem o dom de nos transportar e incluir no seu meio, eu sinto-me lá a fazer parte do grupo.
Adoro a sua forma de escrita.
Beijinhos
Fernanda Ferreira
Olá Celle!
É muito verdade que uma infância feliz e despreocupada deixa sempre uma marca duradoira para o resto da vida, que nós sempre recordamos com saudade.
Obrigado pelas suas simpáticas palavras.
Vitor Chuva
Olá Fernanda!
Com tão generoso comentário, confesso que não sei bem como agradecer. Sei que não mereço tanto, ainda que saiba bem lê-lo, tão bem como aqueles saborosos amendoins comidos à beira-rio!
Obrigada!
Vitor Chuva
Beijinho.
Olá agradável este blogue está bem organizado.........Boa pinta :/
Amei faz mais posts assim !
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