04/05/2010

O CAMPO DE GIRASSÓIS

Trago hoje aqui, um dos muitos simples contos que leio, porque todos eles têm uma lição a dar, sempre!
Este, bem como outros contos deste género, e não só, espero ter a oportunidade de ver serem lidos, por muitas pessoas, que já perderam ou nunca tiveram o salutar hábito da leitura.
O recém criado Clube de Leitura de Campos, Vila Nova de Cerveira, onde habito e do qual faço parte, funciona no Centro Cultural de Campos e está aberto a todos os que queiram retomar o edificante e salutar hábito de ler...ler e voltar a sentir esse gosto quase extinto.

Assim, neste momento, há sessões de leitura de quinze em quinze dias, às segundas feiras, pelas 17:00, seguidas de um chá e uns biscoitos, tudo providenciado pelo Centro Cultural.
Por sermos ainda poucos... para já, e todos pessoas com hábitos arreigados de leitura, começamos por Camilo Castelo Branco e os Doze Casamentos Felizes.
Mas a intenção deste grupo é trazer até si, repito, sobretudo todos os que não lêem ou perderam esse gosto. Estamos a trabalhar nesse sentido e teremos brevemente sessões semanais, assim espero.
Digam lá se não é uma iniciativa louvável.













O Campo de Girassóis

O campo de girassóis estendia-se pela planície; ali cresciam girassóis grandes, pequenos e muito pequenos, plantas de todos os tamanhos. Logo de manhã, levantavam as cabeças e punham-se a olhar para o Sol; e, durante todo o dia, as cabecinhas pasmadas dos girassóis seguiam o movimento do Sol desde que nascia até que se escondia. Quando deixavam de o ver, as cabeças dos girassóis caíam como se não pudessem com tanta tristeza. Todos os dias era aquele bailado de flores seguindo o Sol.
Um girassol, dos tais muito pequeninos, crescia devagar, escondido, encoberto pelos outros. Esse não olhava o Sol; como era muito pequeno, quando os grandes levantavam a cabeça para ver o Sol, ele não via nada: tudo ficava tapado pelas cabeças grandes dos girassóis grandes; portanto, como ele não via o Sol, não havia razão para virar a cabeça como os outros faziam; ficava a olhar para o chão, a ver as formigas e as ervas rasteiras. Por cima dele era um tecto de flores amarelas por onde não passava um único raio de sol. À noite, quando os outros baixavam a cabeça, o girassol muito pequeno podia então ver o céu. O brilho das estrelas deixava-o encantado e dizia: «Tantos sóis! Tantos sóis!» E ficava toda a noite a seguir as estrelas como os outros seguiam o Sol.
Certa manhã, as nuvens cobriram o céu e os girassóis grandes deixaram de ver o Sol; todos se queixaram e as pesadas cabeças inclinaram-se para o chão, privadas do chamamento dos raios do Sol. Como olhavam para baixo, viram o girassol muito pequeno que nem sabia o que era o Sol e não entendia as queixas dos girassóis grandes.
Mas à noite, as estrelas também não apareceram e o girassol muito pequeno sentiu-se triste. Agora já entendia os queixumes dos girassóis grandes, daqueles que olhavam e seguiam o caminho do Sol. Na manhã seguinte, o céu estava ainda encoberto e os raios do Sol não vinham chamar os girassóis para a dança habitual e as grandes cabeças amarelas sentiam-se perdidas sem saberem para onde se virar. Então o girassol muito pequeno falou aos grandes daqueles muitos sóis que ele seguia de noite; e os grandes falaram do Sol quente que seguiam de dia.
— Nunca o vi — dizia o girassol muito pequeno. — Nem sei como é! As vossas cabeças tapam o céu e de dia só posso olhar o chão, as ervas e os animais que se movem a nossos pés.
Os grandes girassóis sentiram-se envergonhados; na sua adoração pelo Sol, não deixavam que um irmão mais pequeno conhecesse aquele que comandava os seus movimentos!
— Vamos deixar-te espaço para que vejas o Sol — prometeram eles. — Mas de noite queremos também olhar esses teus sóis pequeninos.
Quando as nuvens se desfizeram e as estrelas voltaram a brilhar, todos viram o céu estrelado. Na manhã seguinte, os girassóis grandes afastaram-se um pouco; então o girassol muito pequeno viu o Sol e o movimento da sua cabeça deslumbrada acompanhou-o todo o dia.
— Que dizes tu do nosso Sol? — quiseram saber os girassóis grandes. — Não te parece que é lindo?
— Sim, é lindo — respondeu o girassol muito pequeno, ainda estonteado pela luz do Sol. — Mas os meus sóis pequeninos também são lindos! Vou olhar o Sol de dia e as estrelas de noite.
É por isso que no tal campo de girassóis há um girassol muito pequeno que olha para o céu de dia, para ver o Sol, e de noite, para admirar as estrelas.

Natércia Rocha
Castelos de areia
Venda Nova, Bertrand Editora, 1995

9 comentários:

J.Ferreira disse...

Olá!

Sou o primeiro?!!!
Bem parece que falas demais de Cerveira e das acções em que te envolves.
Não por mim, eu acho louvável!
Elevar o gosto pela leitura é sempre uma acção que merece todo o meu apoio.

O conto é lindo e dá-nos uma grande lição.
Nem todos os grandes, os poderosos, os fortes, conseguem ver as mais belas coisas, as infinitas e insignificantes coisas maravilhosas que tornam a nossa vida bela e lhe dá todo o sentido.

Beijo
José Ferreira

Roberta de Souza disse...

Linda história...

bj

Maria Beatriz Ferreira disse...

Querida Ná!

Que bela ideia! Acho que tem tudo para ser um sucesso, mais estando lá tu envolvida.

A maioria das pessoas lê revistas cor de rosa e vê a TV.
Ler um livro, nos dias que correm, é algo reservado a um pequeno grupo de pessoas.

Gostava de estar perto de ti para integrar esse grupo. Muito mesmo.

Beijinhos
Beatriz

A. João Soares disse...

Querida Ná,

«Quem não lê, chapéu». Era o slogan da Europa -América, há algumas décadas para suscitar o gosto pela leitura. Mais do que leitura, é o contacto com o mundo, com as boas obras, as ideias luminosas, que nos fazem aprender até morrer.
Com a leitura verificamos que há muitos motivos para a reflexão que podem ser expostos de variadas formas, algumas muito engenhosas, como esta do girassol. Os grandes não deixam que os pequenos apreciem o sol, a sua luz, o seu calor, as comodidades que ele nos proporciona.
Já o Samora Machel soube expressar esse fenómeno num cartaz didáctico ao seu povo moçambicano:
uuuuuu
b
...b
......b
.........b
OOOOOO


Vou ver se consigo decifrar para os menos conhecedores desta linguagem!!!
uuus(pequenos) b(descem) ÓÓÓs (grandes).
E ai dos pequenos se não obedecerem aos grandes!!! O Poder está nas mãos dos grandes dos milhões de prémio a somar aos milhões de salários!!!

Beijos
João
Do Miradouro

Luis disse...

Querida NÁ,
Como sabe cá por baixo , no Alentejo há lindos campos de girassois, pelo que me deliciei com a história e igualmente com a imagem junta. Não há dúvida que ler é um belo exercício para o cerebro e ajuda a aumentar os nossos conhecimentos. A propósito Vila Nova de Cerveira continua à frente, agora com essa Biblioteca e o grupo de leitura de que faz parte. São estes exemplos que deveriam ser seguidos!
Beijinhos amigos.

Sandra disse...

QUERO AQUI DEIXAR O MEU CARINHO E AGRADECER PELA SUA VISITA. AMIGOS MORAM NO CORAÇÃO.
SEI QUE ANDO AUSENTE. MAS É UM FUNÇÃO DO MEU TRABALHO. NÃO ESTÁ FÁCIL. PROCURO RESPONDER PELO BLOG. MAS HOJE VIM DEIXAR O MEU CARINHO E DIZER QUE SUA PRESNÇA É MUITO IMPORTANTE. JUNTO CONTRIBUINDO, REALIZAMOS E TROCAMOS EXPERIÊNCIAS. MUITO OBRIGADA PELO SEU CARINHO. ASSIM QUE PUDER EU VOLTAREI. MEUS BLOGS AGRADECEM A SUA VISITA. AMIGOS SÃO CONQUISTAS..SÃO PERFUMEM QUE SE EXALAM NO AR E QUE SÃO LEVADOS PELO VENTO AOS MAIS BELOS JARDIM VIRTUAL..
CARINHOSAMENTE,
SANDRA

Fernanda Ferreira - Ná disse...

Meus queridos amigos, José e cunhada Beatriz.

Estou de saída para a minha manhã de aulas, por isso vou agradecer a todos num só comentário.

Todos concordamos que ler é fundamental por várias razões, até para afastar o temível "alemão".
Em Cerveira, há uma excelente Biblioteca num edifício lindo de morrer, o Solar dos Castros.

Este movimento, ao qual pertenço com muita honra, é aqui mesmo, bem perto de casa, numa das 15 freguesias de Cerveira, Campos, no seu Centro Cultural.
Vamos tirar as pessoas dos sofás e levá-las a ler histórias edificantes em vez de futilidades.
Trazer o gosto pela leitura de volta.

O grupo lê em voz alta, cada pessoa um extracto e tenta sintetizar ou expandir, como quiser.
São estabelecidas comparações, diferenças.
Situa-se a época, fala-se da parte social e até política da época.
O que possam imaginar.
Na última sessão, quando demos conta, já tinham passado duas horas.

Estou, como se sente, muito empolgada e animada com o projecto.

Beijinhos a todos.

Irene Moreira disse...


Que iniciativa brilhante e como gostaria de poder estar perto de vocês para partcipar dessas reuniões.
E que lição nos dá o Campo dos girassóis.

Beijos

orvalho do ceu disse...

Olá,
Campo de girassol é por demais lindo!!!
Desejo a vcs aí uma contemplação linda do que há de melhor nessa cena...
Deus os abençoe!
Abraços amigos