03/09/2007

Amizade, Vinícius

Amizade
Do poeta Vinícius de Moraes

Tenho amigos que não sabem
o quanto são meus amigos.
Não percebem o amor que lhes devoto
e a absoluta necessidade que tenho deles.

A amizade é um sentimento
mais nobre do que o amor,
eis que permite que o objecto dela
se divida em outros afectos,
enquanto o amor tem intrínseco o ciúme,
que não admite a rivalidade.

E eu poderia suportar,
embora não sem dor,
que tivessem morrido
todos os meus amores,
mas enlouqueceria
se morressem todos os meus amigos!

Até mesmo aqueles
que não percebem
o quanto são meus amigos
e o quanto minha vida depende
de suas existências ..

A alguns deles não procuro,
basta-me saber que eles existem.
Esta mera condição me encoraja
a seguir em frente pela vida.
Mas, porque não os procuro com assiduidade,
não posso lhes dizer
o quanto gosto deles.
Eles não iriam acreditar.

Muitos deles estão lendo esta crónica
e não sabem que estão incluídos
na sagrada relação de meus amigos.
Mas é delicioso que eu saiba
e sinta que os adoro,
embora não declare e não os procure.

E às vezes, quando os procuro,
noto que eles não tem noção
de como me são necessários,
de como são indispensáveis
ao meu equilíbrio vital,
porque eles fazem parte do mundo
que eu, tremulamente,
construí e se tornaram alicerces
do meu encanto pela vida.

Se um deles morrer,
eu ficarei torto para um lado.
Se todos eles morrerem, eu desabo!
Por isso é que, sem que eles saibam,
eu rezo pela vida deles.
E me envergonho,
porque essa minha prece é, em síntese,
dirigida ao meu bem estar.
Ela é, talvez, fruto do meu egoísmo.

Por vezes, mergulho em pensamentos sobre alguns deles.
Quando viajo e fico diante de lugares maravilhosos,
cai-me alguma lágrima por não estarem junto de mim,
compartilhando daquele prazer ...

Se alguma coisa me consome
e me envelhece
é que a roda furiosa da vida
não me permite ter sempre ao meu lado,
morando comigo, andando comigo,
falando comigo, vivendo comigo,
todos os meus amigos,
e, principalmente os que só desconfiam
ou talvez nunca vão saber
que são meus amigos!

A gente não faz amigos, reconhece-os.
Recebido por e-mail em formato pps

2 comentários:

ANTONIO DELGADO disse...

Há momentos muito bonitos no poema desta postagem seleccionei este...mas há mais!

"alguns deles não procuro,
basta-me saber que eles existem.
Esta mera condição me encoraja
a seguir em frente pela vida.
Mas, porque não os procuro com assiduidade,
não posso lhes dizer
o quanto gosto deles.
Eles não iriam acreditar.

Muitos deles estão lendo esta crónica
e não sabem que estão incluídos
na sagrada relação de meus amigos.
Mas é delicioso que eu saiba
e sinta que os adoro,
embora não declare e não os procure"

Um abraço fraterno e irei linkar este espaço No Ecos.

António

A. João Soares disse...

Caro António Delgado,
Obrigado pelas suas palavras. Por vezes encontramos jóias preciosas que não devem deixar de ser expostas nas montras para serem apreciadas e passarem a fazer parte do nosso saber e orientarem o pensamento e o comportamento.
Como seria o Mundo se cada um procurasse ver um amigo em cada um dos outros, mesmo os mais diferentes.
Um abraço
AJS