27/03/2015

O Teatro e a Poesia


                   O TEATRO E A POESIA
                             (Dia Mundial do Teatro)
                                              
                               Por Zélia Chamusca

O Dia Mundial do Teatro, 27 de Março, foi criado em 1961 pelo Instituto Internacional do Teatro (ITI), data da inauguração do Teatro das Nações, em Paris.

O teatro surgiu nos primórdios da humanidade pela necessidade, do homem, em comunicar.

As primeiras representações cénicas de que há conhecimento, surgiram no Egito e consistiam em  rituais formalizados e baseados em mitos e eram interpretados por homens.

Estas representações surgiram com uma finalidade religiosa, didática e de transmissão de ensinamentos morais e de conduta humana.

Hoje, vai mais além, podendo despertar sentimentos,  desempenhar um papel pedagógico, lúdico, social, político e cultural, etc.

O teatro é uma manifestação artística integrada nas sete artes, tal como a literatura:

1ª Arte - Música (som);
2ª Arte - Dança/Coreografia (movimento);
3ª Arte - Pintura (cor);
4ª Arte - Escultura/Arquitectura (volume);
5ª Arte - Teatro (representação);
6ª Arte - Literatura (palavra);
7ª Arte - Cinema (integra os elementos das artes anteriores mais a 8ª e no cinema de animação a 9ª).

Esta escala é a mais consensual não obstante ter sido ampliada.

 A escala foi ampliada:
Cinema;
Rádio, televisão e fotografia ou agrupados em "media arts";
Banda desenhada;
Arte digital ou RPG ou jogos de vídeo ou modelismo ferroviário (e por extensão modelismo de uma forma geral);
Arte gráfica.

A representação cénica esteve desde os primórdios da civilização ligada à literatura,  muito especialmente, no género poesia.

Por exemplo, os documentos de dramaturgia eram  escritos em versos de escrita rígida obedecendo a métrica.

As grandes epopeias como a Ilíada e a Odisseia são formadas por histórias que eram declamadas na praça pública pelos chamados “aedos”, poetas gregos da época primitiva, que cantavam ou recitavam com acompanhamento da lira. Homero era um “aedo”.

O teatro e a poesia caminharam juntos ao longo da história tendo gerado grandes obras encenadas e recitadas.

Por exemplo:

A peça Romeu e Julieta, de William Shakespeare, foi escrita baseada num poema, de Artur Brooke, publicado em 1562, tendo chegado ao palco sob a forma dramática e recebido  outras personagens  e tramas.

Os Lusíadas de Luís de Camões, ganharam versões teatrais em diversas épocas da história, tanto em Portugal como no Brasil.

Ainda hoje, estas manifestações culturais sob a forma de expressão surgem de mãos dadas em espetáculos que têm como base textos literários.

E porquê este género literário, a poesia?

Porque é que, por exemplo, as canções e  as representações teatrais (ainda hoje algumas) são em forma poética?

É, sobretudo, porque a forma poética tem sonoridade e facilita a memorização, mas, também porque  esta género literário utiliza toda a liberdade de expressão que lhe é permitida quer manipulando as palavras através de incorreção ou utilizando termos de gíria popular quer utilizando figuras de estilo, como recurso literário, para que o autor,(da obra escrita) ou o ator (na representação) possa expressar livremente a sua criatividade e possa transmitir, ao leitor ou ao público, através de uma forma perfeita, tudo o que pretende dizer.


Falando de teatro, não nos podemos esquecer  de falar em Gil Vicente.

Gil Vicente foi o introdutor, o pai, do teatro português e considerado o primeiro dramaturgo português.

A produção teatral de Gil Vicente (que viveu entre 1465 – 1537),    compreende a Poesia Palaciana dos finais do século XV e inícios do Séc. XVI,   é representativa da vida palaciana e reproduz o conceito do mundo dos nobres e dos fidalgos que a produziam, os poetas palacianos.

A poesia palaciana encontra-se reunida no Cancioneiro Geral de Garcia de Resende num conjunto de quase mil poemas de 286 autores.

Gil Vicente, além de poeta foi músico, ator, encenador e ourives, a quem é atribuída a autoria da célebre Custódia de Belém.

A sua obra situa-se, repito, entre os finais do Séc. XV e inícios do Séc. XVI, isto é, entre os finais da Idade Média e o inicio do Renascimento.

Ou seja, a sua obra é marcada pelo pensamento teocêntrico (Deus, céu, inferno) e o humanista (antropocêntrico e racionalista).

A poesia trovadoresca da Idade Média, cantada na praça pública, pelos trovadores, ao som da lira, dá lugar à poesia palaciana renascentista que passa a ser recitada em reuniões, e festas palacianas, sendo cultivada pela aristocracia. É aqui, que se situa a obra de Gil Vicente.

Contrariamente à poesia trovadoresca da Idade Média ou mesmo à poesia épica da cultura clássica, como já referi (Homero na Ilíada e na Odisseia), que era cantada ou dançada na praça pública ao som da lira; a poesia palaciana passa a ser declamada sem música, nos saraus palacianos.

A obra poética de Gil Vicente é constituída por 44 peças teatrais, sendo 17 em português, 11 em castelhano e 16 nas duas línguas.

As peças mais conhecidas são: Farsa de Inês Pereira, Farsa do Velho da Horta, Auto da Alma, Auto da Lusitânia, Trilogia das Barcas (Auto da Barca da Glória, Auto da Barca do Inferno e Auto da Barca do Purgatório), Monólogo do Vaqueiro, Floresta de Enganos, Quem Tem Farelos? entre outras

As suas obras compreendem, fundamentalmente, autos e farsas. Os autos tratam com seriedade de assuntos ligados a fé; as farsas, peças satíricas, criticam os costumes de seu tempo.  

Gil Vicente nunca foi censurado, nem hostilizado, não obstante a característica do seu teatro ser a crítica à hipocrisia da sociedade da época, não escapando ninguém: nem a nobreza, nem o clero, nem o povo.

O teatro em Gil Vicente foi reconhecido e aceite entre os nobres (embora também criticados), talvez porque a sua critica, com uma finalidade moralizante, era apresentada nas farsas, pondo em prática o lema latino conhecido desde a Antiguidade: “ridendo castigat mores” (rindo, corrigem-se os costumes).

A sua atividade cénica era desenvolvida, como já referi, nos palácios, tendo a maior parte das suas obras sido apresentadas na Corte de D. Manuel I.

Esta é a razão de falarmos de poesia neste célebre Dia Mundial do Teatro.

       
           A POESIA E O TEATRO  CAMINHAM DE MÃOS DADAS
                                           
                                           Zélia Chamusca

Hoje a poesia está no teatro
e com ela ele lá esteve.
Poesia que tanto idolatro,
ela sempre em mim esteve.

Caminhando lado a lado
com o amor no coração,
cada um o mais amado,
nem só no palco eles estão.

Há milénios que nasceram
e sempre tão enlevados,
logo ao nascer se prenderam,
e, por nós, também amados.

A caminhar de mãos dadas,
com roupagens diferentes,
personagens retratadas
dos ausentes e presentes.

Estão sempre indissociáveis
desde o enredo à personagem,
são p’ra nós indispensáveis
sobretudo na mensagem.

Perfeita dicotomia
em dialéticas constantes,
vivem, o teatro e a poesia
c’o amor de eternos amantes.

Quer seja um auto ou drama,
quer seja farsa ou tragédia,
independente da trama
fazem da vida a comédia.

Mesmo o ato não divertido,
tragédia sem alegria,
traz-nos à vida sentido
mesmo sendo fantasia.

Mas, se o sonho é fantasia;
sonhar é felicidade
quando temos a magia
para o tornar realidade!
                  «»

           Zélia Chamusca                                                          
              2015-03-27


Fonte de imagem - Google
Sala Garrett no Teatro D. Maria II (Lisboa)
                      

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