Consultores e assessores fazem esbanjar milhões
(Por Paulo Costa Pereira, em O DIABO nº 2291 de 27-11-2020)
Este ano, só até Outubro, o Estado já tinha gasto 100 milhões em ‘peritos’
Na
maioria das escolas faltam professores e
auxiliares. Os hospitais estão à míngua de
médicos e enfermeiros. Muitos empresários enfrentam a falência iminente graças
à incompetência do Governo em lidar com o vírus.
Mas para a pequena classe de consultores e assessores já Costa e os autarcas
dão tudo. É gastar, vilanagem!
Crise? Qual crise? Para uma
pequena classe de elite que vive da mama do Estado português, nunca há crise.
Nem mesmo no ano em que Portugal atravessa profundas dificuldades esta pequena
elite tem vergonha na cara. Falamos, claro, da horda devorista dos consultores
e dos assessores, muitos dos quais ‘boys’ e ‘girls’ oriundos das “máquinas”
partidárias.
Os números, como tudo o que
envolve o Estado português, especialmente durante um Governo do PS, são pouco
transparentes. Mas, segundo os dados que O DIABO pôde apurar, a despesa deste
ano com consultores e assessores, só até Outubro, já está perto de alcançar os
100 milhões de euros, uma maquia absolutamente incrível e que faria uma enorme
diferença investida em áreas onde realmente faz falta.
Apesar de o Estado estar maior
do que nunca, as fortunas gastas em pretensos “especialistas” faz com que os
nossos serviços públicos se assemelhem a uma patética república de Terceiro
Mundo completamente desprovida de quadros superiores. Os nossos governantes chamam
consultores para tudo e mais alguma coisa.
O principal uso dos
consultores e assessores é em serviços jurídicos, em detrimento dos serviços
legais do Estado. Aliás, o que é designado como “serviços de representação
jurídica” é um segmento tão grande das contas públicas que possui um código
próprio para expedir os muitos ajustes directos. Pois sim, caro leitor, a vasta
maioria dos contratos são feitos dispensando qualquer concurso.
Esbanjar,
esbanjar, esbanjar
E não falamos de contratos
pequenos. O Banco de Portugal, há apenas alguns dias, gastou 900 mil euros do
nosso dinheiro para o fim de “patrocínio jurídico”, algo que leva qualquer
contribuinte a questionar se uma organização tão vasta não tem advogados
próprios.
A Infraestruturas de Portugal,
uma empresa pública, gastou 300 mil dos nossos euros para analisar um contrato
referente ao “subtroço Ovar-Vila Nova de Gaia”, um percurso com pouco mais de
40 quilómetros de distância. Fazendo as contas, dá 7.500 euros de análise
jurídica por cada quilómetro de linha.
E os municípios também
contratam o mundo dos consultores e assessores para os “ajudar”, pois a
Gebalis, empresa municipal, gastou 300 mil euros numa só operação do género.
Depois, a Direita é que é acusada de privatizar as funções do Estado.
Não só em advogados se esgota
o fartar vilanagem de despesas com o nosso o dinheiro. A Câmara Municipal de
Viseu, que pelos vistos também não tem técnicos próprios, gastou 163 mil dos
nossos euros em “Assessoria Técnica e Jurídica na Área do Planeamento Urbano”.
A EPAL precisou de gastar mais de 100 mil euros para os “peritos” lhe dizerem
se estavam a soldar bem os canos. E até mesmo para lançar uma simples linha de
apoio à pandemia a Secretaria-Geral da Economia teve de ir buscar um consultor,
com um custo de 80 mil euros.
Sem esquecer que o Estado
também não sabe fazer a sua própria comunicação, por isso é que gastou 56 mil
dos nossos euros em consultores para se determinar o “posicionamento
estratégico e comunicação da marca Aldeias do Xisto”. E em cada crise há uma
oportunidade para gastar, pois afinal uma empresa municipal de gestão de
energias gastou 20 mil euros para “assessoria técnica para a certificação de
máscaras cirúrgicas”...
E que dizer da “Assessoria em Relações
Internacionais” contratada pelo município de Vila Nova de Famalicão, que pelos
vistos agora tem diplomacia independente? E mais, muito mais.
Olhando para os dados,
conclui-se que o nosso Estado, para funcionar, precisa de assessoria cultural,
jurídica, técnica, política, de comunicação, de ‘marketing’, de imprensa, de
inter-municipalidade, de contabilidade, de fiscalidade, de projectos de
especialidade, de análise, de gestão de recursos humanos, de intervenção
social, de ‘design’ gráfico, de pedagogia, de economia circular, de
sustentabilidade tanto ambiental como empresarial, de ‘fitness’, de assuntos do
mar, e esta incrível lista continua, e continua, e continua...
Será que entre os 700 mil
funcionários públicos, um verdadeiro exército, não existem pessoas para
desempenhar estas funções? A resposta é que o próprio Estado sabe que existem.
Tudo
na mesma
O Ministério das Finanças
sabe, e confessa-o nos seus documentos, que o exército de consultores e
advogados é um problema constante nas contas públicas. Mas não é um facto novo.
Uma auditoria do Tribunal de Contas em 2008 já dizia que o Estado estava a
esbanjar dezenas de milhões de euros em consultores e assessores sem
necessidade.
À época, segundo o TC, a vasta
máquina bizantina do Estado português possuía 96 órgãos ou serviços com funções
de natureza consultiva, não percebendo os juízes por que razão se tinha tornado
prática comum recorrer a órgãos externos e privados para ajudar na governação.
Contratos que o TC ressalvou, eram quase sempre feitos por ajuste directo.
Se o problema é conhecido, e o
Estado tem mecanismos para poupar uns milhões, o certo é que nada foi feito, e
as verbas despendidas em consultores e assessores continuam a aumentar.
Olhando de forma ingénua para
o Orçamento do Estado para 2021, alguém poderia acreditar que António Costa e o
seu Governo finalmente decidiram fazer algo. O documento determina liminarmente
que “os estudos, pareceres, projectos e serviços de consultoria, bem como
quaisquer trabalhos especializados e a representação judiciária e mandato
forense, devem ser realizados por via dos recursos próprios das entidades
contratantes”.
Bonito. Mas infelizmente, caro
leitor, é tudo “para inglês ver”, porque a mesma frase, completamente igual sem
mudar uma vírgula, estava presente no artigo 66º do Orçamento do Estado de 2020,
e no artigo 61º do OE 2018, e no artigo 50º do OE 2016... Aliás, a mesma
promessa “bem intencionada” está presente todos os anos desde que António Costa
se tornou primeiro-ministro. E mesmo assim os milhões continuaram a ser gastos
a uma velocidade estonteante em pleno ano de pandemia.
Algo a ter em conta quando
João Leão, ministro das Finanças, se chora no Parlamento por os deputados
obrigarem o seu Governo a gastar mais um milhão aqui e um milhão ali para
ajudar o povo. O senhor ministro sabe bem onde pode ir cortar as gorduras do
Estado, mas talvez não lh’o permitam.
Entretanto, o português comum
na rua gostaria muito de poder ter uma consulta, mas com um médico. E para
essas já as listas de espera são muito longas… ■