Por Zélia Chamusca
O que, fundamentalmente,
identifica um individuo é a sua identidade genética e cultural.
Porém, há uma obsessão
generalizada nas pessoas, algumas das quais instruídas, que as leva a entender que, o que identifica o
individuo é, paradoxalmente, a idade, a data do nascimento, conduzindo este
facto à discriminação etária erroneamente deturpada sobre os valores e as capacidades dos
indivíduos que já vivem há mais tempo e, consequentemente, com mais conhecimento
e experiência de vida.
Um quarentão, que há trinta
anos era considerado velho e ultrapassado, hoje, dizem ser um jovem. Ora, se assim é, porquê considerar um
individuo de setenta anos velho? Se com quarenta anos é ser jovem aos setenta é ser maduro, na
plenitude do conhecimento, da experiência e do saber.
Será ou não?
Identifica-se, erroneamente,
um individuo da classe etária dos sessenta e setenta anos como um ignorante por
desconhecer as novas tecnologias ou se as conhece, já ter sido (pensam) ultrapassado, pois que, as crianças de tenra idade, tomam conhecimento destes meios de comunicação e de trabalho,
para elas, simplesmente, instrumento lúdico de jogos que lhes permite um
desenvolvimento cognitivo mais rápido.
Há quarenta anos já existia
a informática como instrumento de trabalho nas grandes empresas, embora de
forma não generalizada, o que foi acontecendo, gradualmente, até hoje .
Ora, ao longo destes
quarentas anos que poderemos dizer de implementação da informática nas empresas,
estes agora sessentões e setentões adquiriram formação nesta área.
Logo, o que identifica a
pessoa não é a idade mas a profissão e a
formação ao longo da vida, a cultura, a instrução, o meio e, fundamentalmente, a
genética. Sim, porque nem todos os indivíduos
tiveram o privilégio de terem trabalhado em empresas informatizadas tendo tido como instrumento de trabalho um computador.
Claro que não. Um operário da construção civil ou um varredor da rua, cuja
missão social é tão útil e
imprescindível como outra qualquer, não desenvolveu a sua atividade
profissional através da informática.
Assim, há muitas pessoas de sessenta
e setenta anos que desconhecem as novas tecnologias mas não por causa da idade,
mas sim porque não tiveram formação por vários motivos que não vou exemplificar
aqui. Há ainda muitos outros, com mais
de oitenta anos e até mesmo noventa, que dominam as novas tecnologias não porque as tenham utilizado na sua atividade profissional mas,
simplesmente, porque obtiveram formação nesta área.
Estes indivíduos são
geralmente pessoas esclarecidas, cultas, inteligentes e que têm “know-haw” muito mais elevado do que muitos dos ditos quarentões.
A vida é uma aprendizagem permanente
e estes indivíduos já tiveram mais tempo para aprender, para por em prática o
seu saber e transmiti-lo aos mais novos.
Será ou não?
Porquê se convencem os quarentões, já por si
convencidos,e o transmitem aos seus filhos, de que os de setenta, oitenta e até
mesmo de noventa anos (conheço pessoas
que ultrapassaram os noventa e perfeitamente ativas, lúcidas e a trabalhar) estão ultrapassados, velhos e ignorantes?
Com efeito, a
generalidade poderá estar envelhecida e
ultrapassada, mas, nunca pela idade, mas sim pela cultura, pelo que foi ao longo
de sua vida, pelo papel que teve na sociedade.
Estes são os pais de muitos
dos quarentões atuais a quem estes muito devem pelo contributo que prestaram à
sociedade e, fundamentalmente, a conquista de melhores condições de vida que conseguiram proporcionar aos seus filhos.
Ainda, convém clarificar que
quando se fala de reformado alude-se ao pobre de reforma mínima para a qual nem
descontou, não contribuiu, e que na verdade não é reforma mas sim um benefício
prestado pelo Estado pago com os nossos dinheiros, com os dinheiros públicos,
diferentemente do que acontece com o trabalhador que tem uma carreira
contributiva de quarenta e até de cinquenta anos, (bem como a sua entidade
patronal que também descontou para o seu trabalhador) para que tivesse aos sessenta
e cinco anos a sua reforma que lhe permitisse uma vida digna e merecedora destes fundos, reforma, repito, fruto do seu trabalho.
Mas, continuando, quando se
fala em reformado alude-se ao
pobrezinho, doente, velho, etc., etc.
É erróneo entender que
reformado e velho, é peso da sociedade, é indefeso, é alvo a abater, é ninguém!
Porque é que, então, existem
reformados com pensões chorudas, as ditas douradas?
A estes não chamam velhos,
pois não? Nós conhecemos muitos deles. Alguns até desempenham lugares de cúpula
na sociedade.
Estes não são velhos nem
reformados, embora alguns até tenham mais do que uma reforma o que não é permitido ao cidadão
comum, não sei porquê. Estes não são reformados nem velhos, pois não?
Está certo. Isto corrobora o
que pretendo dizer:
Não são os sessenta,
setenta, oitenta anos que definem o indivíduo que é único, singular, mas o seu “status social” e, fundamentalmente, a
sua cultura e instrução e, sobretudo, a sua genética individual.
Porquê discriminar as
pessoas, normalmente acima dos sessenta anos, e, especialmente utilizando e
definindo-os como reformados, utilizando o termo reformado na maioria das vezes
pejorativamente?
Porquê se temos sido e
continuamos a ser geridos por alguns reformados?
Não, estes não merecem ser discriminados…
Discriminado é o pobre
reformado que na maioria dos casos, repito, nem é reformado mas pensionista de
pensão mínima para a qual nem descontou.
Estes e todos os outros que
auferem reformas maiores para as quais descontaram, que é o seu dinheiro e não
despesa do Estado como alguns insensatos e sem moral pretendem convencer os mais
ingénuos ao ponto de provocarem conflito de gerações contra os que são, pejorativa e paradoxalmente, identificados
como reformados. Estes merecem todo o nosso respeito pelo que fizeram na vida, pelo
seu contributo à sociedade, pelo que foram e continuam a ser, pois muitos deles
continuam a prestar serviço bastante útil à comunidade.
Estas pessoas, estes indivíduos
merecem todo o respeito da sociedade.
São pessoas de enorme beleza
moral e física, havendo novos velhos e feios e entre estes que dizem ser velhos há tanta beleza de
alma, educação, elegância e cultura, uns verdadeiros senhores.
Acrescento, ainda, são estes
os que tanto contribuíram para a sociedade democrática que hoje vivemos e que
não devemos, de modo algum, deixar destruir.
Os indivíduos que agora têm
setenta, oitenta e noventa anos, merecem todo o nosso respeito.
Seria bom que refletissemos
sobre os nossos conceitos e preconceitos
generalizados.
Zélia Chamusca
8 comentários:
Muito obrigado por estes argumentos.
Sou octogenário, e tenho consciência de ter as ideias melhor arrumadas do que antes e domino as tecnologias naquilo que me interessa, sentindo capacidade para adquirir mais conhecimentos, se os considerar de interesse.
Hoje, quando almoçava ouvi parte da conversa de dois professores universitários, sobre a actualidade internacional nos aspectos de geoestratégia e geopolítica. Revivi as minhas noções de que a Europa é uma península da Ásia que antes se distinguia pela ciência, o capital e a tecnologia e,hoje carece de apoios quer da Ásia quer da América que antes eram secundárias.
Quando estava a preparar-me para ousar intervir na conversa, chegaram os dois amigos que esperava.
A idade só pode contar para o físico porque o intelecto mantém-se jovem e ávido de acção, até que...
Meu Caro Amigo, Ilustre Sr. A.João Soares,
A sua cultura, inteligência e educação realçam no que escreve e no que nos transmite. Estas qualidades são muito raras nas pessoas de hoje e muito menos nos doutores destes tempos. Dizem que são os nossos jovens mais qualificados de todos os tempos mas a cultura pouco se vê na maior parte destes jovens.
Quando se tem saúde mental, o espírito enriquece em cada momento e, é por isso que os que já viveram durante mais tempo têm maior conhecimento que os que viveram menos. E como eu digo no que escrevi, a vida é uma aprendizagem permanente mas é pena que nem todos queiram aprender.
No prédio onde moro, que tem 19 andares, há 5 pessoas que ultrapassaram os 90 anos. Uma delas tem 94, é professora de música e ainda dá aulas. Costuma ir ao lançamento dos meus livros e é a pessoa mais interessada e feliz que lá se encontra. Eu costumo fazer lhe referência nesses eventos porque esta Senhora é um exemplo, um estímulo e uma esperança para todos nós.
Mas, quanto ao Ilustre Sr. A.João Soares, veja que eu vi, de imediato, que se tratava uma pessoa de bastante cultura e, apenas, o conheço pelos seus comentários e pelo que publica nos seus blogs.
Hoje eu sei o que foi a sua vida profissional, consequentemente o seu status social, mas não sabia e a sua pessoa sobressaiu perante todos os que me visitam na Net.
Eu fui educada por um Capitão doutros tempos. Era tio de minha mãe, meu tio avô. Este Capitão esteve muitos anos em Lourenço Marques, agora Maputo, quando Moçambique estava dividido em capitanias. Este Sr tinha muito nível e cultura e recordo também a forma como era tratado na rua onde morava, Rua Saraiva de Carvalho, Campo de Ourique, por todos os que com ele se cruzavam.
Eram outros tempos... Ele ensinou-me a "saber estar" e hoje quando digo que determinada pessoa não sabe estar, respondem imediatamente:
"Mas o que é isso de saber estar? Cada um está como está e mais nada!"
Perdeu-se a educação, perdeu-se a moral, perderam-se os valores.
Está tudo destruído, destruíram o Grande Império Colonial, destroem o pequeno território português, destroem a nação e destroem-nos a nós.
Tenho muitas saudades dos tempos que vivi e especialmente dos meus amigos, colegas, professores que já partiram. Eu era jovem e eles já tinham perdido a juventude há muito... Por isso quando encontro pessoas de outros tempos que são mais velhas que eu fico encantada...
Desculpe ter-me alargado indo para além deste comentário que transformei em desabafo.
Para mim é um prazer conversar consigo mesmo por este meio.
Deus lhe dê muita saúde e, muito especialmente, saúde mental que é a mais importante, para poder continuar a partilhar connosco o seu conhecimento.
Beijinho,
ZCH
Senhora D. Zélia Chamusca, pensadora e poetisa, muito atenta a tudo o que a cerca,
Agradeço a sua boa intenção, mas deixa-me atrapalhado no meio da minha modéstia em que prefiro o anonimato e a postura de «sem-abrigo». Exijo que me respeitem, mas apenas como cidadão.
No estilo das suas palavras tenho recebido comentários e e-mails de uma colega nossa neste blogue, Celle, Circele Maria, a que peço sempre que não me demova da minha modéstia, pois não possuo perfeição divina. Tenho, isso sim, vontade de ser o mais perfeito possível através de um raciocínio que procuro seja lógico e isento.
Na conversa que ocorreu a meu lado, ontem, um dos interlocutores, o que mais falava, emitiu opiniões muito interessantes e documentadas sobre todos os temas internacionais que têm vindo a público, indo às raízes da história e às biografias de muitos intervenientes. Uma imensa sabedoria. Um modelo que devia ser desejado pelos jovens de hoje.
Beijo
João Soares
A identificação depende bastante do identificador...
Mas o importante é como nos sentimos.
O teu texto é excelente. Para reler.
Tem um bom fim de semana, querida amiga Zélia.
Beijo.
Caríssima colega e poetisa Zélia, também muito ilustrada. Gostei muito de seu post como tantos outros e também do seu comentário sobre nosso timoneiro A.joão Soares, o administrador deste blog do qual participamos, aprendo muito com ambos. Endosso tudo que disse sobre ele, sou felizarda de fazer parte desta equipe.
beijinhos
celle
Querida Amiga Celle,
Daquilo que a Zélia disse e que a Celle, mais uma vez, repetiu, como não quero ser vaidoso nem narcisíaco, só posso dizer, e digo com muito orgulho, temos uma equipa muito valiosa, com valores pessoais de grande vulto.Rogo a Deus, seja qual for a religião de cada um, que nos conceda a continuação deste bom entendimento em perfeita sintonia e tolerância, por muito mais tempo.
Beijos às duas AMIGAS muito ilustres
A João Soares
Nilson Barcelli, Celli e Ilustre Sr AJoão Soares,
Vim visitar este Blog por o Nilson Barcelli me ter dito no "Narciso dos Bosques" que tinha deixado aqui um comentário.
Depois de vos ler fiquei sem palavras.
Graças a Deus que, ainda, há pessoas encantadoras.
Por vezes, num monte de estrume surge uma flor.
O que li é de flores, de flores raras que Deus nos oferece, quando necessitamos, que perfumam e animam a nossa alma.
É uma felicidade ter-vos encontrado.
Tenham um bom fim de semana.
Beijinhos,
ZCH
Nilson Barcelli, Celli e Ilustre Sr AJoão Soares,
Vim visitar este Blog por o Nilson Barcelli me ter dito no "Narciso dos Bosques" que tinha deixado aqui um comentário.
Depois de vos ler fiquei sem palavras.
Graças a Deus que, ainda, há pessoas encantadoras.
Por vezes, num monte de estrume surge uma flor.
O que li é de flores, de flores raras que Deus nos oferece, quando necessitamos, que perfumam e animam a nossa alma.
É uma felicidade ter-vos encontrado.
Tenham um bom fim de semana.
Beijinhos,
ZCH
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